Mesa redonda do Fórum das Letras UFOP 2009
Na Igreja São Francisco, na cidade de Ouro Preto, nenhum objeto está disposto ao acaso. Tudo gira em torno de uma temática, o arrependimento. Há lá uma narrativa em forma de linguagem. Esta percepção foi compartilhada por Flávio Carneiro, ao abrir a mesa Literatura em outras Linguagens, em que estiveram presentes Adriana Lunardi, escritora; Jorge Díaz, espanhol que sonha ser considerado um honorável cidadão carioca, trabalha como roteirista e escritor; e Max Mallman, também roteirista e escritor.
Todos os autores caminham pelo romance, “uma forma literária propensa ao hibridismo”, segundo Flávio Carneiro e que possui a vantagem de, como gênero, tudo lhe caber, como pensa Adriana Lunardi. Em meio ao caleidoscópio de perspectivas aplicadas a diversas narrativas, pergunta-se se toda narrativa é literária.
Mallman declara que “a chave para o roteiro é a literatura, tudo são contar histórias”, quando se refere a essa forma narrativa que, segundo Díaz, nunca deve ser tida como concluída, precisando haver sempre um espaço para melhorá-la. No roteiro, as impressões literárias estão sempre cercadas pelo diretor, pelos atores e pela verba disponível para sua execução. No romance, que desde o século XIX ocupa lugar ilustre na literatura e que soube renovar-se para seu público, há intensa liberdade criativa, uma liberdade que “dá vertigem”, confessa Jorge Díaz. Carneiro expõe a contradição de que há certa imposição, principalmente do mercado editorial, de que os autores sempre falem dos mesmos assuntos.
Sobre a polêmica que gira em torno da caracterização de uma boa ou má literatura, foi levantada a importância da literatura popular para o amadurecimento de leitores. A análise da narrativa televisiva pôs em questão a validade da tradução literária nas telas e a posição da tevê como agregadora ou como dispersora de leitores. Sobre isso, Lunardi afirma que as pessoas têm necessidade de ficção, não importa em qual meio; e que essa questão é um enigma muito maior do que uma mera constatação estatística, referindo-se à audiência e à venda de livros. A liquidez do romance permite que linguagens de outras áreas, como a botânica e as artes plásticas apropriadas por Lunardi, adquiram a conotação literária.
A televisão, ainda que não mostre como exemplo cidadãos leitores, os atrai quando apresenta releituras de obras como “O primo Basílio”, de Eça de Queirós e “Gabriela”, de Jorge Amado. A acusação de que o Brasil é um país carente de leitores devido à importância dada pelos brasileiros para a televisão mostra-se falha quando constatamos que nunca se leu tanto e de maneira tão democrática, em que novos suportes dão mais acesso à informação, quanto hoje. Segundo Mallman, o romance pode canibalizar outros meios, e esta é uma relação recíproca.
Díaz afirma que as pessoas atribuem a promoção da educação e do hábito de leitura à tevê,uma função que, segundo ele, cabe à família e à escola. Lunardi afirma que é responsabilidade do governo dar acesso à leitura e se contradiz ao dizer posteriormente que “preservar a leitura cabe a quem lê e não ao Lula”. Como escritora que possui a liberdade de escrever o que gosta e de não se ater à audiência, “desacredito na superstição numérica; estamos falando de literatura ou de estruturas sociais?”, declara Lunardi.
A literatura, não importa em que linguagem seja apresentada, possui o poder orgânico de formação cidadã. Sua tradução em outros meios e o barateamento de livros são processos que democratizam o acesso à leitura.
colaboração: Marcela Servano
Nenhum comentário:
Postar um comentário